
O coordenador da Comissão Independente, Pedro Strecht, ao entregar o relatório de um ano de trabalho em fevereiro: quatro dioceses ainda não se pronunciaram sobre os nomes que receberam. Foto © CEP
O presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva, confia que a Igreja vai “superar” o problema dos abusos e que “os responsáveis vão tomar as medidas necessárias para que esta página possa ser virada”. As declarações surgem numa altura em que nem todas as dioceses divulgaram os nomes recebidos pela Comissão Independente.
As últimas a fazê-lo foram as dioceses de Leiria-Fátima, Coimbra e Bragança-Miranda. A Diocese de Leiria-Fátima informou que o seu bispo recebeu “uma lista de cinco nomes”, de três padres e dois leigos, da Comissão Independente (CI) para o Estudo dos Abusos Sexuais na Igreja, “seguindo-se uma investigação adicional”.
Um comunicado enviado ao 7MARGENS, assinado pelo vigário geral da diocese, o padre Jorge Guarda, informa que dos cinco nomes recebidos pela CI, três eram de “padres já falecidos”. Quanto aos leigos, um foi, “por precaução, dispensado das funções que exercia”; em relação ao outro “a identificação não está cabalmente determinada, podendo tratar-se de uma pessoa já falecida”.
Quanto à Diocese de Coimbra, recebeu uma lista com sete nomes de clérigos; destes, cinco são padres que já morreram, de um a investigação foi arquivada e há um outro que está “no ativo”, mas sobre o qual se concluiu que “não foi praticada nenhuma forma de abuso sexual de menor”.
No comunicado divulgado às redações, a Diocese de Coimbra informa, sobre o padre no ativo, que pediu “informações à Comissão Independente (CI) para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica em Portugal, que recebeu no dia 9 de março. “Dessas informações conclui-se que não foi praticada nenhuma forma de abuso sexual de menor. Por esse motivo não lhe foram impostas medidas cautelares, embora esteja em curso a investigação prévia canónica”, explica.
Na diocese de Bragança-Miranda foi recebida uma lista com o nome de três padres: um já morreu e sobre um outro já decorreu o “processo civil e canónico”. “Dos três nomes recebidos, um tornou-se naturalmente inconsequente por falecimento. Outro já tinha sido alvo de processo civil e canónico por abuso sexual de menores, processo esse entretanto concluído e que resultou na aplicação de medidas disciplinares segundo as normas em vigor”, lê-se no comunicado divulgado. O “terceiro é de fora da diocese”, e já foi “encaminhado para a diocese de origem”. “Caso se verifique que os testemunhos recolhidos pela Comissão Independente configuram novos factos, será iniciado um novo procedimento canónico”, acrescenta o documento.
Entretanto, o bispo de Beja, João Marcos, veio a público pedir “perdão” pelas declarações que tinha prestado, e reforçar a ideia que “não há lugar para os abusadores no sacerdócio” e que “as suspeitas verosímeis” obrigam a tomar medidas que evitem todo o perigo sobre menores, “incluindo o afastamento das tarefas pastorais”. Beja é uma das dioceses que ainda não informou se tem algum nome incluído na lista da Comissão Independente. “A investigação deve ser rápida e seguir as regras claras definidas pelo Papa Francisco. A colaboração com as autoridades deve ser plena e deve ser cumprida plenamente a lei civil e penal”, explica o bispo, em comunicado.
O bispo de Beja lembra que numa entrevista, a 7 de março, referiu que “Deus perdoa a todo aquele que se arrepende e repara os danos causados pelo mal que praticou”, e deu a entender que subestima “a enorme gravidade dos abusos sexuais de menores e que o perdão de Deus permite ao abusador retomar a sua vida normal”. “De nenhum modo é esse o meu pensamento. Compreendo a deceção que provoquei dentro e fora da Igreja e a todos peço perdão.”
Em Angra, por outro lado, o bispo Armando Domingues, que foi dos primeiros a anunciar o que havia sucedido com os nomes entregues pela CI, veio defender que “não é nenhuma pena nem condenação” a interrupção do magistério que acordou com dois padres, na quarta-feira, na sequência da denúncia de alegado abuso de menores. “O que fizemos não é nenhuma pena nem condenação. Se há uma denúncia devemos atendê-la com seriedade. Estamos na fase de um processo prévio, mas sério, seguindo as orientações de Roma”, disse o bispo aos jornalistas, informa o portal diocesano ‘Igreja Açores’, citado pela Ecclesia.
José Souto Moura, presidente da equipa de Coordenação Nacional das Comissões Diocesanas de Proteção de Menores, considera que a Igreja “só sai bem do problema” dos abusos sexuais se “for capaz de conquistar a confiança de todos”. Sobre as comissões diocesanas, e a necessidade de constituir novas comissões, Souto Moura esclareceu que “as Comissões Diocesanas não são uma criação portuguesa nem da Igreja portuguesa”. “O Papa Francisco determinou, por outras palavras, ordenou que todas as dissesses tivessem uma comissão de proteção de menores e não só de menores, mas também de adultos vulneráveis, porque há pessoas que têm doenças psíquicas que também são abusadas”, defendeu, em entrevista conjunta RR/Ecclesia.
Neste sentido, e depois de sublinhar que as comissões estão a alterar a sua constituição para que apenas leigos constituam essas comissões, Souto Moura indica que elas vão sempre estar sob a alçada da Igreja. “Quem pensar que o tratamento destes casos pode sair do âmbito das Comissões Diocesanas está muito enganado, porque não pode ser uma organização civil a tratar disso”, referiu.
As dioceses de Beja, Setúbal, Vila Real e Lamego ainda não se pronunciaram sobre a lista que lhes foi entregue pela CI.