
Em 2020, o número de crimes contra a minoria cristã na Índia tinha aumentado 40% em seis meses. Foto: United Christian Forum
As tensões interreligiosas na Índia voltaram a conhecer novos episódios, depois da vandalização por desconhecidos de estátuas de Maria, do Menino Jesus e do Sagrado Coração de Jesus num santuário no estado indiano de Andhra Pradesh, causando “choque entre os católicos locais”, segundo avança a agência UCA News.
Com a sucessão de casos, um articulista da mesma agência, numa análise à situação vivida na Índia, atacou “os fascistas [que] usam estratégias manipuladoras destinadas a atrair a simpatia e o apoio da comunidade maioritária, à qual normalmente ‘pertencem’”. “Nos últimos meses”, argumenta Cedric Prakash, estes fascistas “exageraram nos seus esforços para denegrir e demonizar minorias na Índia – particularmente muçulmanos e cristãos”.
O incidente no estado de Andhra Pradesh aconteceu na noite de 14 para 15 de maio. “Ficámos a saber [do ato de vandalismo] através de alguns católicos que estiveram lá de manhã cedo”, relatou o padre Bala Subash Chandra Bose, responsável pelo santuário. O recém-construído complexo do santuário em Edlapadu, no distrito de Guntur, estava a ser preparado para a sua inauguração, disse o padre Bose à UCA News, a 18 de maio. “Os cristãos aqui estão em estado de choque e descrença”, descreveu o padre diocesano de Guntur. “Organizámos uma marcha de protesto na noite de 15 de maio para pressionar por investigações rápidas.”
Três dias depois não havia notícias de qualquer detenção e o padre disse que estavam a ser preparadas novas marchas, uma pela paz para a manhã desta quinta-feira, 19 de maio, seguida de outra marcha de protesto em 22 de maio.
Segundo descreve a agência católica asiática, o santuário tornou-se um improvável ponto de tensão religiosa em 2021, com o partido nacionalista hindu Bharatiya Janata (BJP), do primeiro-ministro Narandra Modi, a alegar que estava a ser construído ilegalmente num local onde existiriam originalmente uma escultura da divindade hindu Narasimha e pegadas de Sita Maa (a esposa do deus hindu Ram). A alegação feita no Twitter por Sunil Deodhar, secretário nacional do BJP e responsável por Andhra Pradesh, foi desmascarada pela própria polícia do distrito de Guntur, que divulgou um vídeo mostrando como o santuário católico e a divindade hindu coexistem em “dois outeiros diferentes”, localizados a cerca de meio quilómetro de distância um do outro.
No entanto, o BJP e os seus aliados hindus militantes continuaram com a campanha, alegando que “máfias cristãs” estavam a “provocar estragos” em Guntur. Já o ministro da Saúde do estado, Vidadala Rajini, visitou o santuário e prometeu investigações rápidas.
“Há seis meses, uma senhora que se identificou como trabalhadora do BJP veio ao santuário e alegou que o lugar pertencia a Sita Maa”, lembrou o bispo Bhagyaiah Chinnabathini, de Guntur. Citado pela UCA News, o prelado recusou-se a comentar quem poderia estar por trás do último ataque, pois o “assunto está sob investigação”. “Temos um relacionamento muito bom com pessoas de outras religiões. Nenhum incidente desse tipo foi relatado no passado, por isso é bastante chocante para todos nós. Não temos ideia de quem poderá estar por trás do ataque, mas condenamo-lo”, respondeu à agência.

O ódio incentivado por fascistas
Para o articulista Cedric Prakash, os fascistas “vomitaram ódio e divisão através dos seus discursos venenosos; incitaram as pessoas à violência e usaram efetivamente o funcionalismo para promover os seus interesses. Os resultados estão à vista de todos: uma maior polarização da comunidade maioritária num país que se orgulhava de seu pluralismo e diversidade”.
Os objetivos destes extremistas hindus são políticos e visam a Constituição secular da Índia. “A sua agenda meticulosamente planeada visa ganhar o poder absoluto nas eleições nacionais de 2024.” E recorda ainda que em 2025 se assinalam os 100 anos da organização que está no comando da “sala de máquinas”, a Rashtriya Swayamsevak Sangh (RSS).
“A ideologia fascista do RSS é contra a constituição secular da Índia, pois o seu objetivo principal é declarar a Índia uma ‘Hindu Rashtra’ (nação hindu) o mais rapidamente possível – para alguns deles já em 2025!”, nota Cedric Prakash, que exemplifica com o que se passa em Goa.
“Já nos últimos dois anos, elementos Hindutva têm vindo a perturbar a harmonia comunal dentro e à volta do sítio arqueológico da Igreja Nossa Senhora da Saúde em Sancoale, Goa, com 416 anos, tentando realizar alguns rituais religiosos em frente à igreja”, sinaliza o autor. “Eles fazem algumas alegações absurdas, como dizerem que a igreja foi construída sobre as ruínas de um templo Laxmi Narasimha. Este, como vários outros templos, que aparentemente foram arrasados, tendo as igrejas construídas sobre eles há cerca de 500 anos durante o domínio português, precisavam de ser reconstruídos.”
Para Prakash, “a questão-chave é esta: eles podem garantir um futuro melhor e mais harmonioso para todos?” A resposta tem de ser dada por todos os indianos nos próximos anos.