
Basílica de Notre Dame de Nice, local dos atentados. Foto © M. Strikis/Wikimedia Commons.
As reações ao atentado ocorrido esta quinta-feira, 29, na basílica de Notre-Dame, em Nice, foram praticamente unânimes entre líderes religiosos e políticos. Católicos, protestantes, muçulmanos, foram muitos os que condenaram publicamente os “atos bárbaros” que deixaram três mortos e vários feridos, e que fizeram questão de sublinhar que o terrorismo é contrário a todas as religiões, apelando ao perdão e à paz. Fora do grupo ficou o cardeal Robert Sarah, prefeito da Congregação para o Culto Divino, que se limitiu a falar do islamismo como um “fanatismo monstruoso”.
A primeira reação foi a do bispo católico de Nice, André Marceau, logo após o atentado. “Com a maior emoção, acabo de saber da tragédia que atingiu a comunidade cristã dos Alpes Marítimos esta manhã. E uma vez mais a cidade de Nice”, começou por dizer no seu comunicado. “A minha tristeza é infinita como ser humano diante do que outros supostos seres humanos podem fazer”, sublinhou, informando que todas as igrejas da cidade estariam fechadas até novo aviso “e colocadas sob proteção policial”. Apesar da dor, concluía a sua mensagem com o pedido, em jeito de oração: “Que o espírito de perdão de Cristo prevaleça face a estes atos bárbaros”.
Logo a seguir, Marceau recebia uma mensagem do Papa, assinada pelo secretário de Estado, o cardeal Pietro Parolin, condenando “de maneira enérgica tais atos violentos de terror”, e assegurando a “sua proximidade à comunidade católica da França e a todo o povo francês, que chama à unidade”.
Pouco antes, respondendo aos jornalistas, o diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, Matteo Bruni, tinha já afirmado que este era “um momento de dor, num tempo de confusão. Terrorismo e violência nunca podem ser aceites. O ataque de hoje semeou morte num lugar de amor e consolação, como a casa do Senhor”.
Bruni referiu ainda que o Papa rezava “pelas vítimas e seus entes queridos, para que cesse a violência, para que as pessoas voltem a olhar-se como irmãos e não como inimigos, e para que o amado povo francês possa reagir unido ao mal com o bem.”
Com um tom completamente diferente seria a mensagem publicada pelo prefeito da Congregação para o Culto Divino, o cardeal Robert Sarah: “O islamismo é um fanatismo monstruoso que deve ser combatido com força e determinação”, escreveu na sua conta de Twitter. “Não vai parar a sua guerra. Nós, africanos, sabemos disso muito bem. Os bárbaros são sempre os inimigos da paz. O Ocidente, agora a França, deve compreender isso”, acrescentou. Em quatro linhas, Sarah deitava assim por terra o espírito da recente encíclica de Francisco, Fratelli Tutti, na qual a responsabilidade dos líderes religiosos no trabalho por uma cultura da paz e do entendimento entre as diferentes religiões é uma das ideias-chave.
Mais alinhado com o Papa esteve o Conselho Mundial de Igrejas (CMI), que agrupa cerca de 350 igrejas cristãs não católicas (sobretudo protestantes e ortodoxas). Num comunicado divulgado na página da instituição, o secretário-geral interino, o padre ortodoxo romeno Ioan Sauca, afirmou que “não pode haver uma justificação religiosa legítima para esta brutalidade, e toda e qualquer tentativa de justificar tais ataques com base na religião tem de ser categoricamente denunciada”.
De acordo com a agência Reuters, citada pelo jornal Público, também um representante do Conselho Francês da Fé Muçulmana condenou o ataque e, “como sinal de luto e de solidariedade para com as vítimas e os seus familiares”, pediu a “todos os muçulmanos em França que [cancelassem] todas as celebrações” do nascimento do profeta Maomé, que terminavam esta quinta-feira.
Países árabes também repudiam violência em nome da religião
A corrente de solidariedade e condenação estendeu-se a inúmeros líderes de países árabes, destacou o Religión Digital. Entre eles, a Arábia Saudita, o Egito, os Emirados Árabes Unidos, a Jordânia, e até mesmo a Turquia, cujo Ministério dos Assuntos Exteriores emitiu um comunicado afirmando que aqueles que “organizam um ataque tão brutal num lugar sagrado de culto não respeitam os valores religiosos, humanitários e morais”. “Nenhuma razão pode justificar o assassinato de uma pessoa ou a violência”, diz o texto.
O governo da Jordânia assinalou, por seu lado, que “o terrorismo é um inimigo comum que não tem nada a ver com uma religião específica e que vai contra os valores da vida e da paz que a religião islâmica representa”.
Ao início da tarde de quinta-feira, era ainda divulgada a nota da Conferência Episcopal Portuguesa. “Lamentamos e condenamos mais este ato bárbaro e violento que elimina vidas humanas e atinge a paz nessa região”, afirmaram os bispos. “Partilhamos os sentimentos de emoção e de perdão expressos nas palavras de D. André Marceau (…), com o qual estamos em plena sintonia.”
Da parte da Conferência Episcopal de França (CEF), as palavras foram de choque. Hugues de Woillemont, porta-voz daquele organismo, qualificou o atentado como um ato “inominável” e garantiu que os católicos “não podem ser considerados um alvo a abater”. Em comunicado publicado na sua página oficial, a CEF assumiu uma “imensa tristeza” e deixou o apelo: “É urgente lutar contra esta gangrena do terrorismo, assim como é urgente estabelecer uma fraternidade concreta no nosso país.”
O Presidente francês, Emmanuel Macron, anunciou entretanto que o dispositivo militar de segurança passará de três mil para sete mil soldados, o que permitirá proteger os lugares de culto, em particular durante a festividade de Todos os Santos, que se assinala no domingo, 1 de novembro.
Macron convocou para esta sexta-feira o Conselho de Defesa, no qual, assegurou, serão tomadas medidas para “proteger” os cidadãos e responder com “firmeza e unidade” ao atentado, o segundo em França no espaço de poucas semanas, depois da decapitação de um professor de História nos arredores de Paris.