
“O apoio à Ucrânia tem feito emergir no mais profundo de mim a Esperança.” Foto © Igreja Ortodoxa da Ucrânia.
A minha actual experiência de vida, com o apoio à Ucrânia, tem feito emergir no mais profundo de mim, valores que poderia ter perdido com o tempo, mas que guardo cuidadosamente como parte da minha Fé.
A Esperança que encontrei nos sorrisos das crianças da paróquia, a fabricarem velas de aquecimento para as trincheiras, a vontade serena e indelével dos idosos que perdem diariamente familiares e amigos, mas permanecem fiéis a Cristo à espera da Paz, a dádiva pessoal dos combatentes que lutam sem descanso e sem cuidar das feridas, porque não esperam qualquer recompensa material, mas todos com ESPERANÇA.
Ao lermos Fernando Pessoa, encontramos vários textos em que ele reflete sobre a “esperança”, advertindo os leitores para não fundarem as suas vidas na concretização de alguns acontecimentos desejados.
A educação cristã nem sempre se reflecte sobre a totalidade da vida dos seus crentes. E a história do Cristianismo nem sempre reflecte a Nova Aliança de Deus através da presença de Jesus Cristo e dos seus ensinamentos.
Em cada um de nós a Esperança pode ter diferentes significados e vivências, alguns ocultando práticas muito pouco cristãs.
Quando alguém tem esperança, ao praticar uma certa acção ou movimento, ou ao dizer uma certa palavra num determinado momento, que tenha como consequência a concretização de um acontecimento histórico ou espiritual desejado, pode estar a acreditar que essa acção tem um papel mágico, como que um despertar de algo que não coincide verdadeiramente com a imagem de Deus e a verdadeira Fé.
Desejar para si ou para outra pessoa qualquer coisa melhor ou pior, resultado de uma emoção ou paixão, pode ter consequências imediatas em cada um de nós: como a alegria, a decepção, dar importância à ilusão, ser perene ou ocasional, terminar com um desaire ou não concretização.
Já a Esperança cristã é ter confiança pura e desinteressada no futuro, é um valor e uma virtude que, com a Fé e a Caridade, evocam o caminho para a vida eterna.
A Esperança é prudente e paciente, nunca é decepção, pertence à intuição profunda de cada um, nunca se extingue, nem com os desaires da vida.
O desejo, emotivo e apaixonado, espera uma recompensa pessoal, para si ou para os outros, egoísta e baseado no excesso de confiança; em caso de falhanço, desmotiva e pode levar à desistência de lutar pela justiça. O sucesso também pode ser tão perigoso como o insucesso, porque ao relevar a importância dos motivos emocionais supostamente associados, é criador de ilusões.
Acreditar no nada pessoal, em que cada um participa apenas como actor, em lugar de ser criador da sua história de vida, porque tudo está escrito algures no Universo, não deixa lugar à Esperança, não pertence à condição de ser cristão.
A Esperança, mesmo nos momentos difíceis, não se extingue e está inscrita no tempo infinito, ancorada numa profunda e transcendente confiança, acima do racionalismo humano e associada à paz interior, à serenidade e sabedoria pela aceitação do Espírito Santo no nosso coração.
Mesmo que os acontecimentos do mundo nos inquietem, é necessário acreditar que pode existir uma ordem das coisas, progressivas e correctoras do mundo. Mas, para isso acontecer é necessário libertarmo-nos de um certo egoísmo pessoal, em que julgamos ser detentores da verdade e que a imagem de Deus na qual fomos criados corresponde ao livre-arbítrio.

Na sua viagem para a Terra Prometida, Moisés enviou espias a Israel, que em lugar de viverem na Esperança, duvidaram e julgaram com a racionalidade humana. (Deuteronómio 1:22-32)
Paulo diz na Carta aos Hebreus (4:1-3) que a todos foi pregada a Boa Nova, mas só alguns tiraram proveito, porque foi acompanhada com a Fé.
A Esperança nem é passiva, nem ocasional, exige de cada um de nós acções desinteressadas, sem raiva e perseverantes, constante e paciente.
A Sabedoria é uma oportunidade de darmos sentido a este mistério humano que é a verdadeira Esperança.
Se questionarmos o “como” e o “porquê” é uma questão de método que faz sentido, quer nas ciências humanas, quer na imagem desconhecida de Deus Senhor criador de todas as coisas visíveis e invisíveis.
Procurar compreender a relação da pessoa humana com Deus, mesmo no mais absurdo dos acontecimentos, pode ser portador de Esperança.
Desesperar no pior dos acontecimentos reais da vida, é uma ameaça à santidade da relação divina que pulsa em nós, porque o sentido de futuro é frágil e estamos centrados em pequenos e efémeros momentos.
A Esperança, pelo contrário, investe na grandeza do ser humano, dos seus direitos fundamentais, na saúde do planeta de que fazemos parte, tornando-se vital na relação entre presente e futuro.
Pela Sabedoria, à medida de cada ser humano, como uma arte de discernir em cada acontecimento a forma como nele devemos existir é um incitamento à vida e damos lugar à Esperança. É procurar na existência de cada um, uma arte de viver e alcançar a ressurreição e a vida eterna.
Tomar consciência das nossas limitações e ignorância, são um acto de sabedoria que alimenta a Esperança, que em lugar de nos sentirmos humilhados, deve constituir um estímulo para investirmos e alargarmos os nossos limites.
Pela Sabedoria ficamos a saber que mais importante do que esperar o futuro é participarmos, activamente, na vida, não pela ilusão, nem pela mentira, mas pela prática incessante de uma certa maneira de fazer sem esperar recompensa e com espírito verdadeiro.
A Esperança é justiça e bom humor, sem intolerância, nem hipocrisia, nem assédio ao ritmo natural do ser humano, quase sempre imposto pela ganância, arrogância e orgulho desmesurado. Porque por vezes o irracional, tido como racional, toma conta das acções do ser humano e afasta-o de Deus.
A Esperança é alimentada por uma sabedoria construtora do ser humano, muitas vezes intuitiva, radicalmente insubmissa e rebelde, de que se reveste a maturidade e santidade de alguns seres humanos.
A Esperança, como renúncia material, dessacraliza as acções humanas que originam dor e sofrimento, mesmo que invocadas por certa razão das coisas, porque haverá sempre uma razão última desconhecida.
Alberto Teixeira é cristão ortodoxo.