
O descontentamento do clero levou os bispos a não comparecerem nos cumprimentos ao presidente da Guiné-Bissau. Na foto, padres diocesanos da Guiné-Bissau reunidos para falar da revisão constitucional. Foto © Vatican News.
Os representantes do episcopado na Guiné-Bissau recusaram, este ano, estar presentes no ato de cumprimentos de Ano Novo ao chefe de Estado do país, sinalizando deste modo o desagrado por recentes críticas públicas do Presidente, Umaro Sissoco Embaló, ao bispo de Bissau.
Este episódio, que ocorreu no passado dia 5 de janeiro, exprime o clima crispado que se vem sentindo entre a Igreja Católica e o chefe de Estado do país, desde a semana anterior, e podem relacionar-se com as relações difíceis que o Presidente e o primeiro-ministro mantêm entre si.
De facto, em 29 de dezembro, o primeiro-ministro recebeu representantes da sociedade civil, incluindo confissões religiosas. No final do encontro, o bispo de Bissau, José Lampra Cá, foi encarregado de falar à comunicação social em nome das entidades recebidas. “A Guiné-Bissau não poderá ser feliz se os seus filhos ou cidadãos não colaborarem no sentido de terem um comportamento moral [ir]repreensível e também no sentido de assumirem a responsabilidade de poderem respeitar escrupulosamente as leis do país”, disse na altura o prelado, segundo notícia da Deutsche Welle-Africa.
O Presidente Sissoco Embaló considerou as declarações do prelado como ingerência no campo político-partidário e, em comentário vindo a público no dia seguinte, observou que “o lugar do bispo é na igreja, do imame é na mesquita e do pastor é no lugar de culto” e deixou o recado: “Se [o bispo] quer fazer política que nos diga, há vários partidos que lhe querem dar o cartão e se ele quiser que o tome.”
O responsável máximo da Guiné-Bissau terá ainda acrescentado, na ocasião, de acordo com o e-Global, que os religiosos deixariam de ter influência no palácio (presidencial), deixando de poder fazer os “elogios que faziam a outros presidentes da República”.
Ainda assim, o Presidente incluiu a Igreja Católica na lista de entidades que convidou para a sessão de cumprimentos. Perante o teor das declarações presidenciais, o bispo entendeu não dever estar presente. “Não é a primeira vez que o Presidente profere impropérios contra a Igreja”, referiu um porta-voz da Comissão Inter-diocesana de Comunicação, segundo o e-Global.
As declarações presidenciais foram contestadas por diversas organizações da sociedade civil e da Igreja, já que, referem, abalam o clima de convivência que tem existido entre as confissões religiosas e o poder político.
Nos últimos dias, o coordenador da Associação do Clero Diocesano da Guiné-Bissau, padre Augusto Mutna Tambá, afirmou ter sido ameaçado de morte, relacionando as ameaças com a defesa que fez do bispo de Bissau, na sua página no Facebook. Tambá perguntou como explica o Presidente a contradição entre dizer que o lugar dos responsáveis religiosos não é na política e ter nomeado o imame de Bafatá para o Conselho de Estado.