
Manuela Silva.
Faz neste dia 7 de outubro um ano que a Manuela Silva humanamente nos deixou, partindo para a Casa do Pai.
Nós, cristãos, contrariamente aos ensinamentos de Jesus, teimamos em celebrar nestas datas a partida, a saudade, a ausência, olhando apenas para o vazio deixado entre nós pelos que partem. Somos “homens de pouca fé” (Mt, 8, 26) como Jesus no-lo refere diversas vezes no Evangelho. E assim consideramos que a morte física, como a conseguimos percecionar, nos leva os entes queridos, esquecendo as palavras de Jesus.
Lembremos só dois episódios evangélicos: a morte de Lázaro e a ida das santas mulheres ao túmulo.
Lázaro, o amigo de Jesus, tal como Manuela a nossa amiga, está doente. As irmãs de Lázaro mandam o recado a Jesus: “Senhor, aquele que amas está doente”. Quantas vezes nas nossas orações dissemos o mesmo a Jesus: “Senhor, aquela que amas está doente”. Ouvindo isto, Jesus disse: “Esta doença não é de morte, mas sim para a glória de Deus… Após dois dias Jesus diz aos seus discípulos: “Vamos outra vez para a Judeia. O nosso amigo Lázaro está a dormir, mas Eu vou lá acordá-lo”. Da conversa de Jesus com Marta sobressaem as palavras de Jesus: “Eu sou a Ressurreição e a Vida. Quem crê em mim, mesmo que tenha morrido viverá” (Jo. 11, 1-44)
A Manuela acreditava e, portanto, está viva!!!
“Passado o sábado, Maria de Magdala, Maria, mãe de Tiago e Salomé compraram perfumes para ir embalsamá-lo. De manhã, ao nascer do sol, muito cedo… viram um jovem… vestido com uma túnica branca… Ele disse-lhes: Não vos assusteis! Buscais a Jesus de Nazaré, o crucificado? Ressuscitou; não está aqui. Vede o lugar onde o tinham depositado” (Mc. 16, 1-6).
A Manuela não está aqui, vive na vida eterna, na glória do Pai e ressuscitará um dia!
A vida para o cristão é apenas uma passagem que Deus quer plena de graça e de fruto no seu amor e no amor aos irmãos. Assim no-lo diz na “oração sacerdotal”: “Não te peço que os retires do mundo, mas que os livres do Maligno. De facto, eles não são do mundo, como também Eu não sou do mundo” (Jo. 17, 15-16).
A Manuela viveu uma vida cheia em Cristo, foi plenamente do mundo. Há um ano saiu do mundo das criaturas e passou para o mundo do Criador.
Premonitoriamente, em março de 2015 (Resiliência. Criatividade. Beleza, ed. Cidade Nova, 2018, pág. 204), Manuela Silva escrevia palavras que, nesta hora de memória, nos fazem bem ser recordadas:
“A complexidade de que se reveste a crise que atravessa – atravessará – a nossa existência neste primeiro quartel do século XXI exige um suplemento de coragem individual e coletiva que vença o medo do novo.
Para vencer este medo coletivo, requer-se vigilância e resiliência, designadamente, no que respeita à estupidez e ao vazio da comunicação social, à superação dos obstáculos reais na concretização de bases sólidas para uma economia e um sistema financeiro baseados na dignidade das pessoas e na prossecução do bem comum, à atenção devida às pessoas mais pobres e, socialmente, fragilizadas, à luta contra a corrupção e o desvirtuamento do poder político ao serviço do bem público”.
Sábias e oportunas palavras ouvidas cinco anos volvidos em plena crise cujo impacto a Manuela não terá sonhado ter a dimensão que vivemos.
Rezaremos na eucaristia do próximo domingo dia 11 do corrente (a celebrar no Convento dos Dominicanos de Lisboa – R. João Freitas Branco, 12, no Alto dos Moinhos, às 12 h, a mesma eucaristia na qual a Manuela participava frequentemente) pela vida eterna da Manuela. Termino esta memória com uma oração/poema pedido emprestado a Frei Mourão, o.p. que, com a Manuela, tantas vezes rezou:
Deus, tu conheces o nosso combate obscuro
e escandaloso com a morte:
que o Anjo da Tua consolação semeie o Aberto
e a Beleza do Teu Nome no rosto da nossa irmã
que ao nosso olhar deixou de ser visível.
Transforma a sua ausência visível em glória invisível
e nos abra o teu Anjo o reino do Dizível
para lá do que nenhuma palavra diz do amor e da morte
para que te reconheçamos
como o barqueiro que a morte muda e muda a vida.
Fernando Gomes da Silva é engenheiro agrónomo