
Francisco Fanhais e Pepe (José António) Feu a cantar a Cantata da Paz, de Sophia de Mello Breyner, na sessão evocativa dos 50 anos da vigília pela paz na Capela do Rato (30-31 Dezembro 1972): a canção é também evocada no documentário da RTP. Foto © Cláudia Teixeira/Comissão Comemorativa 50 Anos 25 Abril.
Um documentário que evoca a vigília da Capela do Rato, realizada há 50 anos em Lisboa contra a guerra colonial, passa na noite desta segunda-feira, 9 de Janeiro, na RTP1. Da autoria do jornalista Jacinto Godinho e do repórter de imagem Carlos Oliveira, Um Gesto Pela Liberdade reúne depoimentos de organizadores e participantes da vigília de 30 de Dezembro 1972 – incluindo excertos de uma entrevista inédita a Nuno Teotónio Pereira –, imagens actuais, testemunhos e documentos, reconstituindo a história daquela iniciativa de um grupo de católicos.
O mesmo documentário passa depois na terça-feira, dia 10, no auditório da Fundação Arpad Szenes-Vieira da Silva (Praça das Amoreiras, nº 56, Lisboa), a partir das 18h. Neste caso, o documentário será seguido de um debate com a participação de José Galamba de Oliveira, Joana Rigato e João Ferro Rodrigues, moderado por António Marujo, jornalista do 7MARGENS. (Neste caso, a participação está sujeita a inscrição prévia para o endereço electrónico geral@50anos25abril.gov.pt)
Entre os depoimentos incluídos no documentário, estão os de Nuno Teotónio Pereira, Maria da Conceição e Luís Moita, Francisco e João Cordovil, José Galamba de Oliveira, António Matos Ferreira, Jorge Wemans, Isabel do Carmo e o padre António Janela.
Como memória e actualização da vigília de 1972, a comunidade da Capela do Rato promoveu uma nova vigília no último 30 de Dezembro, da qual resultou um “Compromisso pela Paz” que pretende actualizar as preocupações dos cristãos com a questão da guerra e da paz.
“No final deste ano, o mundo em que vivemos suscita graves preocupações”, começa por referir o texto, que refere a guerra na Ucrânia e também os conflitos na Síria, Iémen, Líbia, Sudão ou Etiópia, bem como o terrorismo, “por vezes invocando pretextos religiosos” e as perseguições a quem tem fé. Também o combate às alterações climáticas e a falta de uma estratégia “dirigida à eliminação da fome e da pobreza” são referidas no documento, publicado na íntegra na página da Capela do Rato.
“Perante o enorme sofrimento que estes conflitos e esta incapacidade para agir provocam, não podemos cruzar os braços e olhar para o lado”, diz o texto. “Como católicos, queremos renovar o gesto que aconteceu nesta Capela há cinquenta anos”, acrescenta, recordando o refrão do poema escrito por Sophia de Mello Breyner Andresen: “Vemos, ouvimos e lemos, não podemos ignorar.”
Exposições recordam as duas vigílias católicas contra a guerra

Ainda na Capela do Rato, e também na Igreja de São Domingos, podem ser vistas duas mostras expositiva sobre as duas vigílias contra a guerra colonial promovidas por católicos. A primeira, em 1968, que decorreu na igreja da Baixa de Lisboa, na sequência da declaração do Papa Paulo VI do 1 de Janeiro como Dia Mundial da Paz.
Em ambas, recordam-se os contextos da ditadura do Estado Novo, a Guerra Colonial que Portugal mantinha nas então colónias africanas, a oposição crescente de sectores católicos à guerra e ao regime ou as posições de Paulo VI acerca da paz e da autodeterminação dos povos, que o levaram a receber os dirigentes dos movimentos que combatiam a presença portuguesa. [ver 7MARGENS]
A exposição de São Domingos situa a vigília de 1968 na década que sucedeu às eleições de 1958, em que a candidatura de Humberto Delgado congregou vários sectores de oposição, que incluíram manifestos de católicos. Publicações como a revista O Tempo e o Modo e o Boletim Anti-Colonial, uma publicação clandestina que divulgava informação proibida pelo regime, apareceram também durante a década de 1960.
Com um impacto mais alargado, a vigília da Capela do Rato em 30 de Dezembro de 1972 (que se prolongou até dia 31, quando a polícia invadiu a capela e expulsou os participantes, cerca das nove da noite) tomou como mote a mensagem de Paulo VI para o Dia Mundial da Paz de 1 de Janeiro seguinte, “A Paz é possível”, pretendendo debater a Guerra Colonial. É esta segunda vigília, que abanou o regime, cuja memória pode ser vista na mostra que se encontra na própria Capela.