Inquérito 7M sobre o Sínodo 2023 (3)

Um processo à procura da sua gramática

| 15 Mai 2022

Alfredo Teixeira

Alfredo Teixeira: o Sínodo “decorre num contexto social de fadiga democrática”. Foto © Maria Wilton/Arquivo 7MARGENS

 

Na sequência do inquérito sobre o final da fase diocesana do Sínodo em Portugal, feito pelo 7MARGENS, publicámos já comentários do franciscano capuchinho Fernando Ventura e da professora de Ética e teóloga Teresa Martinho. Fica a seguir o comentário de Alfredo Teixeira, professor da Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa.

 

A informação recolhida e apresentada pelo 7MARGENS acerca das sínteses sinodais dá conta de um processo à procura da sua gramática. As diferenças notórias quanto à agenda da sinodalidade podem explicar-se pela heterogeneidade das dioceses, pela assimetria de recursos e pela plasticidade de um processo que tem ainda uma dimensão exploratória, exigindo novas aprendizagens eclesiais. Mas explicar-se-ão também por atitudes diversas quanto à via sinodal: entre o seu reconhecimento como metodologia e a sua compreensão como traço constitutivo da Igreja como corpo.

Num texto recente, o teólogo Christoph Theobald recordava a querela entre Hans Küng e Joseph Ratzinger, em 1961, a propósito do concílio que João XXIII queria convocar. O primeiro sublinhava que a via conciliar se alicerçava na experiência de convocação, semelhante ao chamamento que reúne os cristãos para serem “igreja/assembleia” num lugar; esta proximidade entre sinodalidade e liturgia é, aliás, muito relevante na teologia ortodoxa. O segundo contestou esta correspondência, sublinhando que o concílio não é ekklesia, é synedrion, ou seja, o concílio não realiza a Igreja, como acontece na celebração eucarística, trata-se antes de um serviço específico na Igreja. Aproximando aquelas discussões sobre a conciliaridade e as atuais sobre a sinodalidade, tornar-se claro que estão em causa leituras divergentes – entre “sinodalidade da Igreja” e “sinodalidade na Igreja”, com amplas consequências quanto ao significado do que agora se ensaia.

É necessário recordar que, depois do II Concílio do Vaticano, a sinodalidade tendeu a ser interpretada à luz de um dos seus principais eixos de reflexão, a colegialidade episcopal. Agora, esse paradigma não é suficiente para imaginar as “artes de fazer” um sínodo, que o Papa Francisco elegeu como via de reforma (tal como João XXIII elegeu o concílio). As vias sinodais que agora se ensaiam remetem para uma complexidade que não pode ser resolvida num tipo de comunicação em que a diversidade do vivido, no plano local ou particular, fica à mercê de um processo de compactação, de síntese em síntese, de seleção em seleção, com escassa capacidade de influenciar os processos de decisão. Usando a conceitualidade da ciência das organizações, as incertezas sobre algumas das etapas do processo sinodal podem traduzir uma difícil articulação entre o tempo de “elaborar uma decisão” (law-making) e o tempo de “tomar uma decisão” (law-taking).

Sublinho, por último, que este acontecimento na eclesiosfera católica decorre num contexto social de fadiga democrática, que aponta para a necessidade de repensar as condições de participação e de representação nos processos políticos. Talvez a interação nestes dois contextos, o da construção de novas práticas de cidadania e o das novas aprendizagens sinodais, se possam fecundar mutuamente. Recorde-se que a figura da “cidadania” foi uma das primeiras formas de autocompreensão cristã.

 

Alfredo Teixeira é teólogo e antropólogo; publicou diversos estudos sobre o habitat institucional católico

 

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