
Trabalho realizado por Íris, no âmbito da disciplina de EMRC do Agrupamento de Escolas Abade de Baçal (Bragança)
Prestes a terminar o mês de outubro (mês internacional das bibliotecas escolares), um pouco por todo o país, os alunos foram desafiados a descobrir, por meio da leitura, caminhos para a saúde e o bem-estar.
A propósito deste mesmo mote, recordo com agrado um breve diálogo com alguns dos alunos mais velhos, durante o qual cada um foi listando algumas das leituras que fizeram toda a diferença, não só durante o período de confinamento, mas nas suas próprias vidas. Para alguns era importante o teor histórico das obras que liam, outros sentiam-se arrebatados pelo seu cariz ficcional, havia ainda aqueles que apreciavam a poesia, como arte que conjuga criatividade e melodia, uns poucos preferiam ler banda desenhada e outros ainda optavam pela leitura de contos e parábolas. Numa coisa todos concordavam: a leitura transporta e transforma o espírito, a mente e o coração.
Mas há leituras verdadeiramente extraordinárias, daquelas que pela sua raridade nos transportam para um mundo de significados e nos despertam um outro olhar sobre a vida. Leituras em que é possível descobrir uma força inspiradora em cada palavra. Um aluno falava do encanto que há alguns anos sentiu, numa aula de EMRC, ao ler o conto O Suave Milagre, de Eça de Queirós.
Um conto em que os vários contrastes da vida (poder e fragilidade, orgulho e humildade, esperança e desespero, miséria e abundância) não representam fatalismos, nem são impeditivos de uma autêntica descoberta dos caminhos que nos salvam de um modo de viver doentio.
De modo metafórico, alguns alunos da turma ousaram transportar este conto, o seu título e as suas personagens para os tempos e as circunstâncias que estamos a viver. É certo que a ação principal deste conto se desenrola em torno de uma criança e no seu desejo genuíno de uma intervenção divina miraculosa. Desejo esse espicaçado pela proximidade e partilha fraterna de um simples mendigo, porventura um estrangeiro que encontra na sua casa a hospitalidade sem limites. E eis que o milagre acontece, depois de uma busca interior meticulosamente preparada.
Hoje, aqueles que na sua fragilidade buscam um suave milagre, vivem isolados em apartamentos, lares ou residências. Sentem-se entrevados pelo peso da idade ou pelo contágio da indiferença. Esperam ansiosamente pela fraternidade de um gesto e pela hospitalidade de um afeto, de um qualquer “mendigo” que diariamente ouse aproximar-se para repartir o pão da esperança e da dignidade.
Há mãos e rostos que ajudam a traçar, dia após dia, caminhos de saúde e de bem-estar.
E talvez seja este o verdadeiro mistério da vida: diariamente, distantes dos sinais grandiosos ou espetaculares, continuam a ter lugar pequenos e “suaves milagres”, tão próximos e tão profundos que só um olhar mais simples e atento permite contemplar.
Dina Pinto é professora de Educação Moral e Religiosa Católica no Agrupamento de Escolas Abade de Baçal, de Bragança.