
Para mostrar a falta de credibilidade da comissão espanhola junto das vítimas de abusos, o jornal El País refere os números de denúncias recolhidas pelas comissões instituídas noutros países, todos bastante superiores. Foto © Doidam10.
Criada há um ano, a comissão de investigação dos abusos sexuais contra menores cometidos no âmbito da Igreja Católica espanhola não teve, nem terá, acesso generalizado aos arquivos diocesanos, paroquiais ou das ordens religiosas do país, e recolheu apenas 150 depoimentos de vítimas, assumindo que não tem como objetivo “apresentar um relatório quantitativo”, revela uma extensa reportagem do jornal El País, publicada dia 1 de março.
Contudo, os dados até agora recolhidos pela comissão permitem a Javier Cremades, presidente do escritório de advogados Cremades & Calvo Sotelo, que lidera a equipa de 31 pessoas encarregue pela Conferência Episcopal Espanhola (CEE) de investigar os abusos [ver 7MARGENS] afirmar aos jornalistas que os menores abusados no interior da Igreja
“serão seguramente vários milhares”.
Esta estimativa contraria as referências feitas pelos responsáveis da CEE, que no final de 2021 indicaram 220 vítimas como total de menores abusados, número que, já no final de 2022, admitiram ser de 506.
Mas o próprio Cremades é o primeiro a assegurar que o objetivo da comissão não é apresentar um relatório quantitativo sobre o número de vítimas, e sim “analisar de forma crítica o que se passou, fazer propostas de reparação das vítimas e apontar medidas para que estas situações não se repitam”.
Entre as propostas de reparação, incluem-se sugestões sobre os montantes de eventuais indemnizações a pagar às pessoas abusadas.
A comissão foi criada em 22 de fevereiro de 2022 e imediatamente alvo de críticas pelo facto de Javier Cremades ser católico e membro da Opus Dei. O jornal El País tem sido particularmente crítico em relação ao secretismo em que a Igreja espanhola se tem fechado quanto à disponibilização de informação relativa ao abuso de menores e construiu uma base de dados própria a partir de investigação realizada ao longo de mais de dois anos. Nela, contabiliza 929 abusadores e 1.770 vítimas. Por outro lado, mais de 400 vítimas responderam ao inquérito lançado em julho do ano passado pela comissão constituída, a pedido do Parlamento espanhol, pelo Provedor de Justiça.
Para mostrar a falta de credibilidade da comissão espanhola junto das vítimas de abusos, o diário espanhol refere os dados recolhidos pela comissão independente instituída pelos bispos portugueses (512 denúncias) pela comissão alemã (3.677 casos documentados), pela francesa (6.500 denúncias de vítimas e de familiares destas), pela belga (1.054 denúncias), pela comissão dos Países Baixos (3.712) e pela comissão australiana (4.444 denúncias).