Em texto exclusivo para o 7MARGENS, o Presidente da República considera a nova encíclica do Papa Fratelli Tutti a expressão “de uma coragem ilimitada”.

O Presidente português a cumprimentar o Papa, a 26 de Janeiro de 2019, no Panamá, na altura do anúncio da Jornada Mundial da Juventude em Lisboa. Foto © Presidência da República.
A Encíclica Papal, hoje universalmente divulgada, é um grito brutal e, ao mesmo tempo, a expressão de um poder mobilizador como nenhum dos sucessivos documentos do Papa Francisco.
Em duas palavras, de uma coragem ilimitada.
Grito brutal, ao tomar a inspiração de um encontro com um irmão muçulmano proeminente, ao evocar o exemplo de S. Francisco de Assis e o espírito franciscano, ao recordar a Parábola do Bom Samaritano. Mas, em especial, ao denunciar as misérias, as injustiças, as prepotências, os egoísmos, os isolacionismos, as explorações, os individualismos desumanizadores, os populismos fechados e redutores, as barreiras intoleráveis aos direitos das pessoas e dos povos, às migrações, a incompreensão do mundo do trabalho e dos trabalhadores.
Poder mobilizador, ao apelar à esperança e à luta pela paz contra a guerra, pelo diálogo contra o monólogo, pela globalização com alma contra a globalização dos interesses e dos poderosos, pela convergência entre religiões contra o choque entre culturas e civilizações. E, também, ao juntar S. Francisco de Assis a outras figuras, essas contemporâneas, como Gandhi, Luther King ou Desmond Tutu.
Coragem ilimitada, que arranca da Fé cristã, mas se abre a todas as militâncias conscientes dos riscos do tempo presente, no mundo como nas mais diversas nações que o compõem.
Coragem que implica que o testemunho dos crentes não seja matéria privada, mas de intervenção pública, que tenham o dever de intervir para provocar ou apoiar a mudança num sentido da solidariedade ou, como diz, da amizade social.
Esta Encíclica Fratelli Tutti, Todos Irmãos, traduz muito do que de mais prospetivo e inovador houve no Concílio Vaticano II [1962-65] e é um sinal de que a Igreja Católica não se acomoda, não transige com as modas de fechamento e de egocentrismo destes tempos, antes segue a linha da mensagem radical do Evangelho da opção preferencial pelos deserdados na economia, como na sociedade, como na política.
Marcelo Rebelo de Sousa, Presidente da República