
Delfim Gomes, nomeado bispo auxiliar de Braga em 7 Out 2022. Foto: Direitos reservados.
Incompreensível, surpresa e estranheza: em Angra, Bragança e Setúbal, três padres descrevem assim a reacção do clero das respectivas dioceses, ao saber que o padre Delfim Gomes, da diocese de Bragança-Miranda, foi esta sexta-feira nomeado para bispo auxiliar de Braga. A reacção prende-se não com a pessoa ou com a nomeação, mas com o facto de aquelas três dioceses aguardarem ainda por novos bispos – no caso de Angra, já há mais de um ano. O novo bispo, que ficou com o título de Dume, acompanha deste modo o actual arcebispo de Braga, José Cordeiro, também originário da diocese transmontana.
Delfim Esteves Gomes, nascido a 1 de Janeiro de 1962, em Bragança, estudou teologia no Porto e em Bragança e foi ordenado padre em Setembro de 1989. Era, desde 1992, pároco da Senhora da Assunção (Vila Flor), mas desempenhou já os cargos de pároco da paróquia escolar, vice-reitor e responsável pela formação do Seminário diocesano, conselheiro da Fundação “Mensageiro de Bragança”, presidente da Comissão de Arte Sacra e Presidente da Comissão para a Administração dos Bens Eclesiásticos.
O nome de Delfim Gomes já era um dos que corria nos bastidores eclesiásticos como um dos nomes possíveis para bispo de Bragança, conforme há três semanas referiu o 7MARGENS. Mas, além de tudo, Delfim Gomes era já uma pessoa da confiança do actual arcebispo de Braga, uma vez que foi também vigário episcopal para o clero nos últimos 11 anos, como recorda uma nota da diocese de Bragança-Miranda enviada à nossa redacção.
Com a saída deste padre para bispo auxiliar de Braga, aparece agora como cada vez mais provável que Nuno Almeida, auxiliar da diocese minhota, “troque” com José Cordeiro e Delfim Gomes e venha a ser nomeado para bispo de Bragança-Miranda – e tal pode acontecer em breve. A linguagem eclesial católica fala normalmente na nomeação dos bispos como um processo conduzido pelo Espírito Santo, mas é normal que o actual arcebispo de Braga queira, como acontece em casos semelhantes, ter agora alguém da sua confiança como braço direito.
Braga, diocese criada no século III, é uma das três arquidioceses metropolitas de Portugal (a par de Évora e Lisboa) e durante vários séculos, quando o poder temporal dos bispos também era grande, o seu arcebispo disputou com os de Toledo e Santiago de Compostela o título de “primaz das Espanhas” – que ainda é usado, muitas vezes, apesar de já não ter qualquer aplicação prática. A diocese tem hoje 551 paróquias para 850 mil habitantes, num território com mais de 2800 quilómetros quadrados.
“Fiquei de boca aberta”

O actual arcebispo de Braga, José Cordeiro, voltou esta sexta-feira à sua ex-diocese, de onde também provém o novo auxiliar. Foto © DACS/Braga
Na diocese de Bragança, que agora fica sem um segundo membro destacado da sua hierarquia, a saída de Delfim Gomes é vista com sentimentos mistos: “Estamos alegres por dois elementos do nosso presbitério terem merecido a confiança – um para arcebispo de Braga e outro para auxiliar”, diz ao 7MARGENS o padre Fernando Calado Rodrigues, 53 anos, pároco da cidade de Bragança e colunista semanal do Jornal de Notícias.
“Mas a nossa alegria não é completa porque continuamos a aguardar um bispo para a diocese”, acrescenta, recordando que José Cordeiro foi nomeado para Braga em Dezembro. “Não compreendemos porque se nomeia primeiro um auxiliar para uma diocese que já tem um e se vêm recrutar padres a dioceses que têm um clero reduzido”, afirma, dizendo que vários padres partilham deste mesmo sentimento.
Esta sexta-feira, aliás, quase que pareceu escolhida a dedo para o anúncio da nomeação: quer o ex-bispo de Bragança e actual arcebispo de Braga, José Cordeiro, quer o núncio do Vaticano em Portugal, Ivo Scapolo, estiveram na cidade transmontana, na assembleia do clero. O núncio tem um papel chave na escolha dos bispos, já que a ele compete enviar os processos e nomes possíveis para o Vaticano. Há quem responsabilize o núncio por esta demora, mas o 7MARGENS já noticiou que há 20 por cento dos padres em todo o mundo (e pelo menos três casos em Portugal) a recusar os convites para bispo. Scapolo fica em Bragança até domingo, mas a notícia que o clero da diocese mais queria ainda terá de esperar. Poucos dias, algumas semanas, mais dois meses ou três? Já ninguém arrisca.
Se Bragança é a mais atingida directamente por esta nomeação, a notícia também provocou os mesmos sentimentos cruzados em Angra e Setúbal. “Admito a possibilidade de haver alguma razão ponderosa que não conheço. Mas só posso usar a expressão do povo: fiquei de boca aberta!”, diz ao 7MARGENS o padre José Júlio Rocha, 54 anos, da diocese de Angra.
“Pode-se aplicar aqui o que Jesus disse ‘Àquele que tem, ser-lhe-á dado e terá em abundância’ (como Braga); ‘mas àquele que não tem, mesmo o que tem lhe será tirado’ – é o caso de Bragança”, acrescenta o professor do Seminário Episcopal de Angra e membro do Colégio de Consultores da Diocese. “É incompreensível que, havendo três dioceses em sede vacante, uma delas há um ano, se nomeie um bispo auxiliar para Braga”, diz ainda, referindo-se à diocese açoriana: Angra ficou sem bispo em Setembro de 2021, com a nomeação do anterior titular para Viana do Castelo.
Em Setúbal, reaçcão idêntica: “Ficamos satisfeitos e com alegria pela nomeação para Braga” e porque a pessoa em questão é alguém “que toca o povo nas suas feridas e dores”, começa por dizer o padre Nuno Pacheco, 34 anos, pároco de Alhos Vedros (Moita) e Santo André (Barreiro). No caso de Setúbal, que está “na linha da frente de acolhimento à Jornada Mundial da Juventude, gostaríamos também de ter essa atenção” de ter um bispo nomeado brevemente, diz. Mas “numa altura em que três dioceses estão à espera de bispos residenciais, faz sentido nomear os titulares para essas sedes”. Por isso, “causa surpresa e é estranho que se opte por nomear primeiro um bispo auxiliar”, acrescenta.