Fátima sem sinais de preocupação

Santuário de Lourdes pondera remover mosaicos de Rupnik

| 5 Abr 2023

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Aparição de Jesus aos discípulos depois da ressurreição, obra na fachada da Basílica de Nossa Senhora do Rosário, em Lourdes (França), da autoria do padre Marko Ivan Rupnik: a estupefacção de quem vê a arte de alguém que terá provocado feridas a tentas mulheres. Foto © António Marujo/7Margens

 

O padre jesuíta e artista Marko Rupnik, acusado de ser um contumaz abusador sexual de mulheres, tem obras de grande envergadura em alguns dos principais santuários católicos do mundo, que começam a suscitar problemas nos fiéis e devotos que ali se deslocam para rezar e celebrar. O Santuário de Nossa Senhora de Lourdes, nos Pirinéus franceses, é um dos que têm a fachada da basílica decorada com grandes painéis de mosaicos do artista de origem eslovena. E o bispo local entendeu que é melhor prevenir do que remediar, admitindo que pode ter decisões importantes a tomar, não excluindo a mais drástica – remover os mosaicos.

Os mosaicos de Lourdes foram colocados pelo atelier de Rupnik – o Centro Aletti – em 2008, por encomenda do Santuário, no 150º aniversário dos acontecimentos ali registados em 1858, quando uma pequena pastora afirmou ter visto Nossa Senhora. O motivo da obra de arte são os “Mistérios Gozosos” do terço. “Como acontece com todas as obras de arte – diz um comunicado do bispo de Tarbes e Lourdes, Jean-Marc Micas – são mais apreciadas por alguns, menos por outros, mas a grande maioria dos peregrinos e visitantes de Lourdes sublinham a sua beleza.”

O bispo explica, nessa tomada de posição, as razões pelas quais “a questão do estatuto das suas obras e o seu futuro se colocam”. Essas razões situam-se, do seu ponto de vista, na relação entre a situação do autor e aquilo que os peregrinos, visitantes e devotos procuram na sua ida ao santuário.

O primeiro aspeto passa pelos factos que, desde há meses, não cessam de vir a público e que apontam para múltiplas situações de abuso sexual de adultas, no contexto do seu ministério presbiteral. Isso foi já reconhecido quer pela Congregação da Doutrina da Fé quer pela Companhia de Jesus, a que Rupnik pertence, e que lhe aplicou sucessivas (e pouco efetivas) sanções.

 

Mosaicos na transmissão televisiva do terço

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Milagre de Jesus nas bodas de Caná, obra de Rupnik em Lourdes: que fazer com estes mosaicos? – pergunta o bispo. Foto © António Marujo/7Margens

 

Por outro lado, adianta o bispo Jean-Marc Micas, “a questão geral do estatuto das obras dos artistas envolvidos em situações de abuso é aqui consideravelmente mais sensível”, “dada a especificidade do Santuário de Nossa Senhora de Lourdes”, que é “um lugar onde muitas vítimas vêm à Imaculada Conceição em busca de consolo e cura”. Acresce que, como disse o responsável diocesano ao semanário católico La Vie, no dia 28 de março, cada um dos painéis de Rupnik, que representa um “mistério gozoso”, são regularmente destacados nas emissões que transmitem a oração do terço diariamente pelo canal televisivo KTO (em sinal aberto na internet).

“O sofrimento [das vítimas] é grande diante dos mosaicos de M. Rupnik neste mesmo lugar: não podemos ignorá-lo”, reforça o prelado. Perante a situação, em consonância com o reitor, o bispo levou o assunto, no final de março, a uma reunião do Conselho de Orientação do Santuário, um organismo criado em 2021 e que reúne duas vezes por ano, tendo presente que “as vítimas devem estar no centro das (…) reflexões” e que “qualquer decisão terá consequências graves”.

Nessa reunião, deliberou-se criar um grupo de reflexão para elaborar os elementos necessários à tomada da “melhor decisão”. Constituído pelo bispo, pelo reitor do santuário, por um(a) especialista de arte sacra, uma pessoa vítima de abusos e um(a) psicoterapeuta, o grupo recebeu como instrução “não rejeitar qualquer hipótese de decisão a priori”.

 

E Fátima? E outros santuários e igrejas?

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A “visão do inferno” no painel do altar da Basílica da Santíssima Trindade, em Fátima. Obra da autoria de Marko Ivan Rupnik. Foto © António Marujo/7Margens

 

O problema de Lourdes coloca-se também na multiplicidade de espaços católicos – calcula-se que mais de 200 – que Rupnik e o seu atelier decoraram, um pouco por todo o mundo. Quer sejam obras nas fachadas, como no santuário francês, quer no interior, como na Basílica da Santíssima Trindade, em Fátima (onde toda a parede do fundo do chamado ‘presbitério’, por detrás do altar, é por ele decorada), muitos fiéis sabedores da autoria poderão sentir-se perturbados, sobretudo tendo sido vítimas de abusos.

O 7MARGENS contactou o Gabinete de Comunicação do Santuário de Fátima, para saber se houve, nos últimos meses, algum tipo de reações ou movimentações da parte de fiéis e devotos, relacionadas com a obra de arte do padre Mark Rupnik. A diretora do Gabinete, Carmo Rodeia, disse-nos desconhecer “até ao momento, qualquer manifestação ou expressão de incómodo dos peregrinos” com os trabalhos daquele artista que, recorde-se, é um dos muitos, nacionais e estrangeiros, que intervieram naquela igreja e imediações, inaugurada em 2007.

Carmo Rodeia disse ainda, em resposta a uma outra questão, que os responsáveis do Santuário de Fátima não têm previsto tomar qualquer iniciativa sobre o assunto, embora tenha admitido que o tema já foi falado internamente.

Os mosaicos de Rupnik causaram já incómodo em vários sítios, como o 7MARGENS noticiou: na Polónia, um grupo de vítimas de abusos, que desde 2019 se encontravam uma vez por mês para rezar no santuário dedicado a João Paulo II, em Cracóvia, decidiram mudar de lugar, não se sentiam bem estar a rezar num lugar decorado pelas obras de um alegado agressor.

Em Espanha, como contámos na mesma notícia, a Universidade Católica Francisco de Vitoria, suspendeu os trabalhos de decoração de uma nova capela, entregues a uma equipa liderada por Marko Rupnik. Em meados de dezembro, tinha sido a Pauline Books and Media a decidir retirar do mercado três traduções de livros de Rupnik para inglês. No início do mesmo mês, o bispo de Versalhes (França) divulgou um comunicado conjunto com o pároco de Montigny-Voisins anunciando o cancelamento de uma obra de decoração da nova igreja da paróquia, também contratada ao padre Rupnik.

 

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