
Foto © Greyson Joralemon/Unsplash
Das virtudes teologais, a esperança é talvez a mais invisível, incompreendida e, no nosso tempo, desprezada. Custa esperar. Esperar o quê e para quê? E como se espera?
Num tempo que promete tudo a curtíssimo prazo, a esperança cristã parece um adereço de velhos, um artifício em desuso e sem graça.
O que está na moda são os passos frenéticos em direção a mil lugares, o tumulto interior deixando indecifrados tantos sinais, a agitação exterior buscando distrações, dispersando-se em deveres e implodindo em rotinas…
Num mundo que promete felicidades fáceis e à mão, correr atrás delas é o mote, invejando a correria dos outros que lá chegam primeiro. E, ali, compulsivamente gerar likes e stories, já cá estive e sou o máximo, como se a felicidade fosse um puzzle de lugares de sonho ou de gente importante.
A espera pode então ser vista como o reduto dos pobres, aqueles que se permitem nadar no tempo porque o têm, submergindo e deixando de ouvir os ruídos dos outros para apenas ficar, na apneia do sossego, reduzidos ao essencial do ser.
A espera implica um eu e um tu e implica também uma promessa. Um eu que confia e um tu que é confiável e a promessa entre ambos, que há de cumprir-se tal como foi formulada.
O Antigo Testamento apresenta a promessa, selada numa Aliança: centenas de anos esperando e vivendo da Lei como caminho: “Amarás o Senhor teu Deus…”(Deuteronómio, 6, 4-5). Bem cedo o amor resumiu a Lei, sendo o salvo conduto para o cumprimento da promessa. Essa espera, para muitos nunca alcançada nesta vida, gerou muitos justos e fez de nós um povo, fiel ou nem tanto.
Numa pedagogia necessária para um percurso por vezes árido e sem fim à vista, o Levítico já tinha dado pistas concretas para uma espera digna: “Amarás o próximo como a ti mesmo” (Levítico 19,18). Não ficar no amor como uma ideia, nem nos mandamentos um mero cumprimento externo. Descer ao coração e ter o cuidado do outro, como se fosse eu próprio.
Em Cristo, realizou-se o cumprimento da promessa e a espera tem um Rosto. Tem um Rosto e um modo: “Amai-vos uns aos outros como Eu vos amei.” Com Jesus, a mandamento do amor radicalizou-se, não deixando de lado nada da existência, alegrias e dores. Por elas, cheias de amor, fomos salvos!
Mais ainda, esta não é uma espera de um bem futuro, mas de um bem presente: “Se alguém me ama, guardará a minha palavra, e o meu Pai o amará, e nós viremos e faremos nele a nossa morada.” (João 14,23)
Sabemos Quem nos espera e a Quem esperamos. Sabemos quem Ele É e como nos amou. A espera permite-nos tornar-nos semelhantes a Ele, pois podemos deter-nos a vê-Lo tal como Ele É (1 João 3,2).
Tão perto do dia em que celebramos o nascimento do Redentor, possa o nosso coração parar e preparar o berço dentro de si. Porque a espera, tecida de amor em múltiplas formas, não é um pormenor. A espera é um caminho necessário para que o nosso coração se transforme e se torne capaz de Deus.
Dina Matos Ferreira é consultora e docente universitária.