O que (quem) vemos, quando olhamos as margens?
As margens. Quando olho as margens como um desafio, quando elas são um chamamento para sair de mim, do espaço que conheço e que me conhece, e ir mais além (re)encontrar-me na Humanidade do Outro, essas margens valem a pena! Porque essas são as margens que geram a vontade de criar pontes – sem pontes não é possível caminhar para o Outro, sem pontes não acolho e ninguém me acolhe, não abraço e ninguém me abraça.
Quando as margens são vontade de amar o próximo, de o aceitar nas suas fragilidades, nas suas limitações, nas suas diferenças, essas margens valem a pena! Porque essas são as margens que salvam, são as margens em que, quando aporto, encontro novas riquezas e novos sentidos para a minha própria existência; que me fazem olhar com humildade para as outras de onde parti: lá longe, pequeninas e bem menos importantes do que eu pensava que eram quando delas zarpei, tão cheia de certezas sobre o valor moral dos outros.
Mas, se eu olho as margens como linhas de corte, arrogantes e definitivas, que me separam e resguardam do Outro, que posso delas esperar como Pessoa? Se as minhas margens marginalizam, se desdenham, se recusam, se reprovam, que posso eu esperar senão manter-me do tamanho que tenho no sítio de onde nunca saio? Se as margens são muros que afastam, que impedem, que escorraçam, que posso eu esperar do Outro senão medo, mágoa e ressentimento? Afinal, ninguém pode esperar receber mais do que aquilo que está disposto a dar.
No nosso dia-a-dia, faz por isso todo o sentido que nos perguntemos sobre o tipo de margens que vamos tendo uns com os outros. Se são margens que geram pontes, ou se são margens que se transformam em muros. Quando questionados sobre o que achamos correto, facilmente aderimos à retórica da solidariedade e do diálogo. Mas, o que acontece verdadeiramente quando nos cruzamos com pessoas diferentes, que não comungam das nossas ideias, da nossa Fé, das nossas posições ideológicas, das nossas escolhas? Aí, não raras vezes estamos mais dispostos a bater do que a debater, a gritar do que a escutar, a condenar do que a compreender. É verdade que não é fácil (re)aprender a olhar o Outro como irmão e a entender a margem como “Possibilidade”. Mas temos de tentar. Vale a pena tentar. Cristo não temeu a margem: não nos feriu, não nos gritou, não nos condenou, não se envergonhou de nós. Por isso, neste período quaresmal, crentes e não-crentes, tentemos aprender com Ele, com o Seu exemplo, algo que nos ajude a transformar as nossas margens em autênticos encontros com a Humanidade.
Isabel Estrada Carvalhais é Professora associada da Escola de Economia e Gestão da Universidade do Minho, doutorada em Sociologia e candidata independente do Partido Socialista ao Parlamento Europeu.
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Breves
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O arcebispo de Barcelona, cardeal Juan José Omella, criou a associação canónica para a canonização de Antoni Gaudí, a que preside, substituindo a associação civil pró beatificação que até agora vinha promovendo a beatificação do conhecido arquiteto, autor, entre outras obras da igreja da Sagrada Família, em Barcelona.
Após 371 dias de cativeiro
Libertado missionário alemão que estava sequestrado no Mali
O padre alemão Hans-Joachim Lohre, missionário há mais de 30 anos no Mali e raptado em novembro do ano passado perto da escola onde trabalhava, em Bamako (capital do país), foi libertado no domingo, após 371 dias de cativeiro, avançou a fundação Ajuda à Igreja que Sofre (AIS), que apoiava o seu trabalho na região.
“Em cada oportunidade, estás tu”
Ajuda em Ação lança campanha para promover projetos de educação e emprego
“Em cada oportunidade, estás tu” é o mote da nova campanha de Natal da fundação Ajuda em Ação, que apela a que todos os portugueses ofereçam “de presente” uma oportunidade a quem, devido ao seu contexto de vulnerabilidade social, nunca a alcançou. Os donativos recebidos revertem para apoiar os programas de educação, empregabilidade jovem e empreendedorismo feminino da organização.
Workshop presencial e online
Originalidade e dignidade do humano em debate no Vaticano
A Pontifícia Academia para a Vida organiza, em 12 e 13 de fevereiro de 2024, um workshop multidisciplinar sobre o tema “Humano. Significados e desafios”, com especialistas de diferentes partes do mundo, que pode ser acompanhado à distância, mediante inscrição.
Boas notícias

Encontro em Pemba
KAICIID reúne líderes religiosos e comunitários para promover paz em Cabo Delgado novidade
O Centro Internacional de Diálogo – KAICIID, com sede em Lisboa, dinamizou no final da semana passada um encontro de “sensibilização inter-religiosa” em Pemba (capital da província de Cabo Delgado, Moçambique), no qual reuniu membros das comunidades locais, líderes religiosos e organizações da sociedade civil. Deste encontro saíram compromissos a curto e longo prazo de promoção do “diálogo entre líderes religiosos e decisores políticos como ferramenta de prevenção de conflitos” naquela região.
É notícia
Entre margens
O “caso” frei Bernardo de Vasconcelos: 100 anos da sua vocação monacal e uma carta novidade
Vem isto a propósito de uma efeméride que concerne o jovem Frei Bernardo de Vasconcelos (1902-1932), monge poeta a quem os colegas de Coimbra amavam chamar “o Bernardo do Marvão”, nome pelo qual era conhecido nas vestes de bardo, natural de São Romão do Corgo, em Celorico de Basto, Arquidiocese de Braga, que a Igreja declarou Venerável e que, se Deus quiser (e quando quiser), será beatificado e canonizado. (Pe Mário Rui de Oliveira)
Secularismo e Direitos Humanos novidade
O Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) decidiu, no passado dia 28 de novembro (ver 7MARGENS), que a administração pública de um país pode proibir os seus funcionários de usarem visivelmente qualquer sinal que revele crenças filosóficas ou religiosas, a fim de criar um “ambiente administrativo neutro”. Devo dizer que esta formulação me deixa perplexa e bastante preocupada. É óbvio que todos sabemos que a Europa se construiu sobre ruínas de guerras da religião. (Teresa Toldy)
Viver a Fraternidade: testemunho sobre a Irmãzinha Maria Montserrat de Jesus
Há pessoas que marcam em definitivo a nossa vida. A Irmãzinha Montserrat marcou a minha. Com a sua partida para Deus, a 13 de março do corrente ano, surgiram claras as recordações de tanto caminho andado em conjunto. Aqui fica um pequeno testemunho sobre tão grande amiga e mestra. A Irmãzinha Maria Montserrat de Jesus era catalã e viveu uma grande parte da sua vida em Lisboa, como religiosa da Fraternidades das Irmãzinhas de Jesus de Carlos de Foucauld.
Cultura e artes
Ora Vê #3 novidade
o cair da folha prepara um caminho sobre as águas
[o jordão sempre separa os testamentos]
o tombar do profeta anunciará ao verbo o tempo da conjugação
— uma foto de Miguel Cardoso, com texto de Pedro Benino
“O valor simbólico da sacristia”
Dois personagens, um espaço, uma exposição
O Museu Nacional Machado de Castro continua apostado em ancorar algumas das propostas que nos faz «nas “funções fundamentais dos museus”[2], como sejam a preservação do património, a investigação|estudo dos acervos, a comunicação (interpretação e disseminação ativa do conhecimento sobre as coleções) e a educação». Propõe-nos, desta vez, e até 31 de dezembro, uma revisitação d’O Valor Simbólico da Sacristia, centrando o olhar no conjunto de painéis sobre madeira que Simão Rodrigues executou, nos alvores do século XVII, para a nova sacristia da Sé Velha, mandada construir havia poucos anos por D. Afonso de Castelo Branco, então bispo de Coimbra. (João Marujo)
O génio dos Pogues (1957-2023)
Há bar aberto nos céus da música — morreu Shane MacGowan
Dois nomes maiores irlandeses da música deixaram-nos em 2023. Depois da morte de Sinéad O’Connor, em julho, agora foi Shane MacGowan, o poeta de dentes podres e de voz inconfundível que, entre copos de whiskey, cerveja preta e muitos cigarros, compôs com a sua banda The Pogues belas canções rock de travo folk irlandês.
Filme “O Pub The Old Oak”
Como da desesperança nasce a esperança
Com os seus 87 anos, Ken Loach está tentado a dar por concluída a carreira de realizador com esta película que representou um duro esforço ao longo de dois anos e meio. Contudo, como admite em recente entrevista (Revista do Expresso, 24 novembro), talvez o exemplo de Manoel de Oliveira o leve a prosseguir ainda.
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Jornada extensa. Temporã. Três da manhã. Viagem longa. Escalas. Fuso horário. Reuniões à chegada. Demasiadas. Oito da noite. O cansaço a impor-se. A fome a acusar negligência. Ingredientes de sobra para encerrar o dia. Pausar. Parar mesmo. No entanto insuficientes para ignorar os relatos que começáramos a escutar.
Visto e Ouvido
Igreja tem política de “tolerância zero” aos abusos sexuais, mas ainda está em “processo de purificação”
Agenda
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